19.1.10

A Mesa

Muita gente. Aparenta ambiente de festa. Uma festa que é feita na rua, por sinal no meio de prédios que ele não conhece. Todos falam de tudo e de nada. Palavras conjuntas, que resultam num murmurinho monocórdico.

No meio de toda aquela confusão, está uma mesa que ele consegue ver distintamente, quase como se sobre esta pairasse. Dá por si sentado na ponta dessa mesa, e do seu lado esquerdo, á sua frente está uma rapariga, com quem conversa.

Ele sabe que acabou de ter uma conversa, só não sabe sobre o quê. Não se recorda.

A rapariga está pensativa, repara ele.
Com palavras prestes a escorregar da boca, que apenas esperam o momento certo para serem soltas.

Então, ela atira: "sabes, apaixono-me com facilidade..."

Ele fica surpreendido mas evita demonstrá-lo.

Lembra-se instantaneamente do que lhe disse um dia a mulher vestida de preto: "Apaixonas-te com facilidade. Mas também és novo, é normal..."


Não só se surpreende pelo desabafo espontâneo que acabou de presenciar, mas também porque partilha de semelhante "característica". Se ele tivesse dito o que na alma lhe ia, que também ele é assim, talvez quem sabe, se apaixonassem ali mesmo. Naquele instante. No meio daquela festa.

Mas não. Só soube perguntar: "E isso é problema?"
O rapaz assim o fez, pois viu uma ligeira expressão, um misto de tristeza/confusão/receio, na face da rapariga, quando esta em ténue voz lhe sussurrou as derradeiras palavras.


A memória está fraca.
Ou então é um corte na película.
Talvez propositado.
Deve ser, porque a rapariga subitamente levanta-se e afasta-se sem nada dizer.

Ele acorda. Confuso.
Acha que não lhe foi dada a resposta para uma pergunta que não fez.

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