26.12.10

Fisionomia do Desespero

Ganha-se assim o pesar da ausência. Escondem-se verdades entre sorrisos, sabendo que a tinta pode estalar a qualquer momento. Respiram-se mentiras e vivem-se projecções. Omissões que as fabricam. Somos todos muito contidos. Uma revolução sofreria o mundo se isto fosse contrariado. Gente pelos passeios a gemer de dor. Gritando não a dor física mas a emocional, que ninguém e toda a gente compreenderia. Afinal quem não conhece a linguagem do desespero? Recurvados no chão, de abdómen contraído, vomitariam as entranhas no mundo. Uma turba de revoltados a cambalear em pernas bambas. Uma morte por outra. O ciclo é necessário. O repouso numa única, decompõe. A substituição é uma questão de sobrevivência. Dores mortas, pessoas vivas. Seria assim que o mundo rodaria, a matar dores próprias em gritos catárticos. Primordiais. Primitivos. Eternos também. A terra a nossos pés seria forçada a ouvir. E o céu. Chorariam todos. Chorariam o que deviam ter chorado e o que ainda chorarão. Alguns não saberiam o porquê, mas talvez encontrassem a razão entre lágrimas vertidas no asfalto frio. Dores acumuladas ou recentes. Não haveria distinção. Não terminariam os gritos porque nada disto seria cura, mas não existiriam overdoses de vida como a que sinto agora. A bílis produzida por uma neurose reprimida de um gole existencial em excesso. Ou este desejo corrosivo por um coma confortável.

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