1.4.11

Mais do Menos

Como poderia eu saber que mais tarde viria mesmo a preferir o antes ao agora? Esse antes que mal consegui suportar, parecia ao menos ter no desespero um sentido embutido, enquanto que isto, aqui e agora, se perde em letargias de causa por determinar. Andei anestesiado de alegria, muito antes de sentir necessidade de o fazer, para agora a tentar reencontrar. É apenas loucura que ficou por tratar. Mas que ninguém saiba disso! Shiuu... A ver, que vejam apenas as folhas, não se atrevam a perguntar pela extensão da raiz, que se teme a alienação no outro, muito mais depressa que se nota a nossa. Que certinho tudo anda. Que bonitinho. Merdas! Até hoje, nunca cruzei caminho com alguém totalmente são. Histórias de gente estável a vida toda, são fábulas em que alguns encontram inspiração, sem entenderem a impossibilidade disso, sem verem à distância a mentira em que acreditam. Ficarão também eles loucos de procurar exasperadamente a sanidade.
Parece que agora noto a respiração. Só agora? Estou ofegante. Ia jurar que vi sombras a mexerem ali no canto. Agora vi! Mexeu-se diante dos meus olhos. Entrei em casa há horas, exausto de caminhar na rua apenas meia hora que me tirasse este peso da cabeça e tudo o que consegui foi tremer a cada passo para controlar o grito que quase cuspi em tudo. Senti-me observado, mas não havia vivalma a retorquir o meu olhar preocupado. Cobre-me os ombros um manto negro  que em certas posições parece deixar que se lhe vejam as pontas dobradas. Descubro o nada a olhar-me de volta. Só quero repousar. Mas acordo com vontade de dormir. Adormeço com vontade de acordar. Não durmo quando quero, nem acordo quando preciso. Valha-me ao menos a inconstância permanente!
Já sinto as têmporas pulsarem. Reflectem dilatadas no espelho as minhas pupilas, sem ter tomado droga alguma. Treme o corpo novamente, em espasmos que não sei se consigo controlar. Vou tentar. Parece que sim, mas é melhor se não o fizer. Agonia-me o espírito, estou fisicamente indisposto, prestes a desmaiar. Como pode a mente aguentar tamanha auto-destruição? Olho as coisas mas não as olho realmente. Esfrio. Fico parado a observar como o branco do tecto se engole a si mesmo. Não posso estar a ensandecer se ainda reconheço a doença, certo? Cascáticos vão estes pensamentos. É fonte a congelar antes da prisão adivinhada. Agora é tarde demais e dou por mim implorando piedade por cada cabelo arrancado.

3 comentários:

samson disse...

assombroso.

murmuria disse...

Mas quem és tu que vês, ouves e sentes precisamente o mesmo que eu?Dizem que os loucos se compreendem na loucura.

André C. disse...

samson, não o desejo a ninguém. obrigado pelo comentário.

murmuria, cada vez mais me convenço disso.